quarta-feira, 27 de maio de 2009

Sobre a foto anterior

"A fotografia de uma menina correndo espavorida por uma estrada, nua e queimada por napalm foi a imagem da guerra do Vietnam. E a que melhor reflectiu o impacto do conflito na infância.Em 8 de Junho cumprem-se 35 anos sobre essa data.A famosa menina é hoje embaixadora da Unesco e dirige uma fundação de auxílio à infância.Passou 14 meses no hospital e sofreu 17 operações por causa das queimaduras de napalm. Apesar do tempo decorrido, continua a sofrer de fortes dores em todo o corpo. "A 8 de Junho de 1972, estávamos todos escondidos no templo. Os soldados escutaram os aviões sobrevoando o lugar e gritaram, "corram, corram!" Corri com os meus irmãos e primos, e quando me dei conta tinha perdido a roupa e a minha pele começava a arder. A dor era tão terrível que perdi a consciência", relatou num perfeito espanhol a actual directora de uma Fundação com o seu nome, e que na altura tinha nove anos. Kim sofreu queimaduras em 65% do corpo, mas Nick Ut, o fotógrafo vietnamita autor da foto que deu a volta ao mundo e ganhou o Prémio Pulitzer em 1973, recolheu-a, levou-a ao hospital e salvou-lhe a vida. "Desmaiei com dores"!"Eu não sabía o que era a dor. Já tinha caído da bicicleta uma ou outra vez, mas o napalm é o pior que se possa imaginar. É queimar-te com gasolina por baixo da pele. Desmaiava de cada vez que as enfermeiras me metiam na banheira e cortavam a pele morta.Mas não morri. Dentro de mim havia uma menina pequena mas forte, que queria viver".

O que penso da guerra ?

Torturas na prisão de Abu Ghraib II

Torturas na prisão de Abu Ghraib I

Link de Goya: http://www.galleryone.ca/Goya/Goya.htm

A guerra como absurdo



Os desastres da Guerra, de Goya:

Veja link: http://www.galleryone.ca/Goya/Goya.htm

O herói sem heroísmo




A Execução de Maximiliano, de Manet, é o exemplo de uma obra que contesta os princípios da grande pintura histórica, acusada de ser um gênero constituído por convenções ocas.
Aqui, o episódio, dramático e recente, está despido de qualquer celebração, de qualquer sentimento. É uma narrativa fria, asséptica, sem grandeza ou pequenez. Um fato da vida tão simplesmente, desprovida de significação. Segundo Jorge Coli, "uma maçã é quase uma esfera, quase forma pura, indiferente, silenciosa; mas um fuzilamento pressupõe dramas e heróis. Eliminar dele o pathos em benefício de uma neutralidade visual não é apenas rejeitar a narração, é excluir da História seu sentido episódico: o acontecimento excepcional deixou de sê-lo, para nivelar-se ao corriqueiro.

A crítica à pintura heróica no século XIX viria também daqueles para quem a vida burguesa já não permitia mais o heroísmo. O herói torna-se assim um simulacro.
Segundo Coli, "quadros de batalha foram sempre ficção construtora da História. Mas perderam, com a modernidade, seus poderes de convicção, porque as forças dinâmicas do heroísmo esvaziaram-se em jogos guerreiros e sangrentos, que se revelavam mais e mais aberrantes. Da Cartuxa de Parma a Guerra e Paz, a literatura expôs, no século XIX, as batalhas militares como excrescência absurda. O mundo burguês não é heróico; ele pode, eventualmente, servir-se do heroísmo, mas não acredita nele".

Herói entre cadáveres.




Ainda segundo Maraliz Christo, esta obra de Horace Vernet (A tomada de Malakoff) não celebra a figura do herói, que posta constrangedoramente sobre uma pilha de cadáveres.

O desaparecimento do herói




Segundo Maraliz, esta obra anuncia de certa forma o esvaziamento da imagem do herói, que parece totalmente insensível e alheio ao anúncio da vitória.

Herói na Pintura Histórica de Batalha

Em meio aos grandes clarões que se irradiam por entre as sombras, o herói é celebrado na pintura histórica, apresentado como aquele que sofre em nome de uma causa nacional. Seu sofrimento é diretamente proporcional à sua coragem e heroísmo. E as telas conferem-lhe um lugar de destaque: é o centro da ação, em torno do qual se agrupam outros episódios de sofrimento e dor. O herói é para ser visto - e não pode haver dúvida quanto ao seu lugar no episódio.

Características gerais da Pintura História

É possível apontar aqui os elementos formais mais comuns na pintura histórica, sobretudo a de batalha, que é o que nos interessa.

- Valorização do heroísmo individual: culto ao herói, destacado na obra.
- Apelo às emoções do observador, com alta carga de dramaticidade.
- Dramatismo da natureza, convulsionada por cataclismas.
- Teor violento da batalha, com a representação cuidadosa de cadáveres e feridos, por vezes colocados no primeiro plano.
- Destaque dado às condições difíceis (muitas vezes climáticas) do contexto da batalha.
- Olhar em vôo de pássaro, que permite ao observador contemplar a cena desde o primeiro plano até o horizonte.
- recurso a animais, como cavalos, representados em movimentos acrobáticos, a nuvens de fumaça densa.
- centralização da ação principal, onde se encontra o herói.
- recurso visual à estética vertical das armas, compondo ainda mais o cenário de violência.
- no caso da estética neoclássica, a ênfase no exotismo étnico e cultural dos inimigos, geralmente orientais.
- excesso de movimentação e agitação, dadas pelo movimentos dos personagens e pela vibração das formas e cores.
- pintura de grandes proporções, que visam conferir monumentalidade ao evento representado.

Antoine Gros. Napoleon Bonaparte on the Battlefield of Eylau, 1807.

Antoine Gros

Conceito de Pintura Histórica

FONTE
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=327&lst_palavras=&cd_idioma=28555&cd_item=8

Pintura Histórica

Definição

O termo se aplica à pintura que representa fatos históricos, cenas mitológicas, literárias e da história religiosa. Em acepção mais estrita, refere-se ao registro pictórico de eventos da história política. Batalhas, cenas de guerra, personagens célebres, fatos e feitos de homens notáveis são descritos em telas de grandes dimensões. Realizadas, em geral, sob encomenda, as pinturas históricas evidenciam um tipo de produção plástica comprometida com a tematização da nação e da política. Se os acontecimentos domésticos, o cotidiano e os personagens anônimos são registrados pela pintura de gênero, os grandes atos e seus heróis são narrados em tom elevado e estilo grandioso pela pintura histórica. O desafio pictórico colocado por essas telas reside na experimentação simultânea de diferentes gêneros artísticos: das paisagens e naturezas-mortas (nos panos de fundo e elementos do cenário); dos retratos e cenas de gênero (ensaiados na caracterização dos personagens e ambiências). A realização de telas com grande número de elementos, por sua vez, incita os pintores a procurarem soluções inéditas em termos de composição.

A pintura histórica adquire prestígio nas academias de arte, alçada ao primeiro plano na hierarquia acadêmica a partir do século XVII, com a criação da Real Academia de Pintura e Escultura em Paris, 1648. Verifica-se aí um estreitamento das relações entre arte e poder político, e uma associação mais nítida entre a instituição e uma doutrina particular. A paixão pela Antigüidade - revelada nos temas mitológicos e nos motivos históricos - associada à clareza expressiva e à obediência às regras definem o estilo que se converterá no eixo da doutrina acadêmica. A pintura neoclassica, que tem como centro a França do século XVIII, explora fartamente os temas históricos. Diante da Revolução Francesa, o modelo clássico adquire sentido ético e moral. A busca de um ideal estético da Antigüidade vem acompanhada de ideais de justiça e civismo, como mostram as telas do pintor Jacques-Louis David (1748 - 1825). Os retratos dos mártires da revolução realizados por ele atestam a face engajada de sua pintura (A Morte de Lepetier, A Morte de Marat e A Morte de Bara, 1793). David é também o pintor oficial de Napoleão, como mostra a série sobre o imperador realizada entre 1802 e 1807, na qual se destaca a gigantesca Coroação de Napoleão (1805-1807). Antoine-Jean Gros (1771 - 1835), seguidor da forma austera de David, inclina-se às cores e vibrações dramáticas nas batalhas napoleônicas que executa - por exemplo, A Batalha de Eylau (1808) -, o que faz dele um elemento central no desenvolvimento do romantismo francês.

Na Espanha, pinturas históricas são realizadas a partir do século XVI por diversos artistas. Cenas de batalhas são executadas pelos pintores da corte de Felipe IV, comprometidos com a representação da invencibilidade do exército espanhol em suas campanhas militares. Nesse contexto, Francisco de Zurbarán (1598 - 1664) realiza A Defesa de Cádiz e Diego Velázquez (1599 - 1660), A Rendição de Breda (1634-1635), ambas glorificando os triunfos do reinado de Felipe. Posteriormente, cenas históricas têm lugar no interior da variada produção de Francisco José de Goya y Lucientes (1746 - 1828), por meio das dramáticas telas sobre a ocupação francesa da Espanha (1808-1814), em que o pintor coloca a sua ênfase na revolta dos cidadãos de Madri contra os ocupantes (Fuzilamento, 1808). Com esses trabalhos de Goya, a dimensão heróica e celebrativa da pintura histórica encontra sua primeira contestação. Mas é na série de 65 água-fortes, Os Desastres da Guerra (1810-1814), que o pintor revela sua visão realista dos acontecimentos: as cenas de pesadelos e as figuras macabras falam das atrocidades da guerra, pelas quais são responsáveis franceses e espanhóis. A própria opção por uma "técnica menor", a gravura - procedimento que Goya dignifica -, revela o quanto a pintura histórica poderia estar comprometida com a apologia do poder.

A preocupação com o passado e com as origens, assim como a interferência no tempo presente, marcam a visão de mundo romântica. O impacto da Revolução Francesa e o mito napoleônico se refletem nos temas históricos e nas cenas de batalhas, explorados pelos pintores. Théodore Géricault (1791 - 1824) retoma a história em telas como A Jangada da Medusa (1819). O quadro trata de um acontecimento contemporâneo (um naufrágio ocorrido em 1817), narrando, em tom épico, o embate entre vida e morte, assim como as relações hostis entre o homem e a natureza. Eugène Delacroix (1798 - 1863) se detém sobre a história política desde o início de sua carreira (O Massacre de Quios, 1824, A Grécia Sobre as Ruínas de Missolongi, 1827). Mas é o célebre A Liberdade Guia o Povo (1850) que evidencia o compromisso do pintor com a história de seu tempo; a tela registra a insurreição de 1830 contra o poder monárquico. A liberdade, representada pela figura feminina que ergue a bandeira da França sobre as barricadas, converte-se em alegoria da independência nacional.

Marcas neoclássicas e românticas se fazem sentir na pintura histórica exercitada pelos pintores acadêmicos brasileiros. A produção inscrita no interior da Academia Imperial de Belas Artes - Aiba possui fortes vínculos com o governo imperial de Dom Pedro II (1825 - 1891), para o qual os artistas criam uma iconografia nacional - A Coroação de D. Pedro II, de Porto Alegre (1806 - 1879). Os nomes de Pedro Américo (1843 - 1905) e Victor Meirelles (1832 - 1903) associam-se diretamente à pintura histórica no país. Pedro Américo tem no desenho, e na preocupação com a execução das figuras, um dos traços característicos de sua pintura. A Guerra do Paraguai serve de modelo para as narrativas épicas de suas telas, por exemplo, aquelas realizadas em 1871: Batalha do Campo Grande, Batalha do Avaí e Passagem do Chaco. Nota-se aí uma atenção aos detalhes, minuciosamente descritos: os trajes militares, os cavalos, a fisionomia dos personagens. O uso de fotografias como apoio para realização de suas telas históricas revela a preocupação de Pedro Américo em diminuir a distância entre uma arte celebrativa e a documentação histórica. Victor Meirelles também se deteve no registro da história nacional, na representação do império e na guerra do Paraguai. Do ponto de vista da composição, observam-se afinidades de sua pintura com o espírito romântico. Dentre suas principais obras estão: A Primeira Missa no Brasil (1860), A Batalha dos Guararapes (1879), Passagem do Humaitá e Combate Naval do Riachuelo (ambas de 1882). A expressividade da cor e a atenção às paisagens estão entre as marcas do pintor. O tom grandioso e o ímpeto da ação aparecem como elementos fortes de suas narrativas visuais, que, longe de assinalarem a crueldade da guerra, visam enobrecê-la.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Indianismo: notas breves.

O debate racial no Brasil do século XIX

Martius e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro

Link:http://www.scielo.org.ar/scielo.php?pid=S1851-37512008000100004&script=sci_arttext

"A idéia do Brasil como uma nação mestiça tem sua própria história, envolvendo diferentes circunstâncias e personagens. Aqui, no entanto, a reflexão se limitará a como a idéia se formou e se transformou em três momentos importantes da trajetória brasileira: no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), pouco depois da independência, quando primeiramente foi problematizada a centralidade da confluência das três raças para o entendimento da especificidade do Brasil; nos anos de declínio do cativeiro, momento em que se espraiam as teorias racistas e é reelaborada a questão da mestiçagem; e na fase de intensificação da modernização do país, isto é, no pós-1930, período de consolidação do mito das três raças como base fundadora da nação brasileira.

No primeiro ato, trata-se de pensar o papel da história e dos historiadores no processo de construção da identidade nacional brasileira. A criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), em 1840, é um momento especialmente significativo do processo de constituição imaginária da nação, pois como observou Lilia Moritz Schwarcz:

Criado logo após a independência política do país, o estabelecimento carioca cumpriria o papel que lhe fora reservado, assim como os demais institutos históricos: construir uma história da nação, recriar um passado, solidificar mitos de fundação, ordenar fatos buscando homogeneidades em personagens e eventos até então dispersos (2002: 30).

Uma das primeiras atividades do IHGB foi a realização de um concurso para avaliar a melhor proposta de pesquisa e divulgação da história do Brasil, quando saiu vitorioso o opúsculo Como se deve escrever a história do Brasil, redigido por Carl Friedrich Philippe von Martius. O ponto de vista do autor era absolutamente claro em frisar a ligação entre historiadores, historiografia e Estado. Para ele, o historiador deveria estar a serviço da pátria, e, em termos de Brasil, isso significava escrever a história como um "historiador monárquico-constitucional", evitando tanto uma "história-crônica", composta por uma multidão de fatos estéreis, quanto uma história por demais "erudita". Afinal, o objetivo da história era atingir o "povo", com uma linguagem "popular" e "nobre". Além dessas prescrições, von Martius salientou que o traço realmente distintivo do Brasil era o encontro de três raças (africanos, europeus e ameríndios). A história brasileira deveria ser a história desse encontro, do processo de formação de uma população mestiça e do aperfeiçoamento dessa gente por meio da liderança civilizadora do branco. Segundo Martius:

Qualquer que se encarregar de escrever a história do Brasil, país que tanto promete, jamais deverá perder de vista quais os elementos que aí concorreram para o desenvolvimento do homem.
São porém estes elementos de natureza muito diversa, tendo para a formação do homem convergido de um modo particular três raças, a saber: a de cor cobre ou americana, a branca ou caucasiana, e enfim a preta ou etiópica. Do encontro, da mescla, das relações mútuas e mudanças das três raças, formou-se a atual população, cuja história por isso mesmo tem um cunho muito particular (1991 [1844]: 30).

Enquanto a monografia de von Martius frisava a importância do encontro, da mescla e das relações mútuas das três raças para a história da jovem nação, a poesia americana de Gonçalves Dias, outro membro eminente do IHGB, fornecia um dos primeiros sentidos desse processo. Sua poesia denunciou o extermínio dos povos americanos, traçando a dimensão trágica subjacente à formação do Brasil, oriundo do encontro entre os colonizadores portugueses, as tribos tupis, que foram enfim dizimadas, e os africanos, reduzidos a escravos. "O que resultou do encontro", escreveu Alfredo Bosi citando Gonçalves Dias, "foi uma nação 'que tem por base/ Os frios ossos da nação senhora/ E por cimento a cinza profanada/ Dos mortos, amassada aos pés de escravos'." (1992: 186).
(...)
"Parte significativa dos homens de ciência adotou a perspectiva das teorias racistas para pensar os dilemas e perspectivas da nação e para justificar, com base nas supostas diferenças raciais, as hierarquias sociais que ainda opunham senhores e escravos, mas também e principalmente a "boa sociedade" e a crescente população pobre e livre, formada por negros, índios e mestiços. Como advertiu Roberto Ventura, é precisamente no clima da abolição e com a instituição do cativeiro com seus dias contados que floresce o pensamento racista brasileiro.

A questão étnica se tornou central no momento de implantação do regime republicano e do trabalho assalariado. O racismo científico foi adotado, de forma quase unânime, a partir de 1880, enviesando as idéias liberais, ao refrear suas tendências democráticas e dar argumentos para estruturas sociais e políticas autoritárias (Ventura 2000: 354).

Do evolucionismo, dois conceitos se tornaram centrais para os homens de ciência do fim do século XIX: meio e raça. O Brasil não era uma cópia da metrópole, porque possuía um "meio" e uma "raça" particular, que lhe conferiam uma identidade nacional (Ortiz 1985: 17). A noção de povo se confundia, nesse momento, com o problema étnico do caldeamento das três raças: brancos, índios e negros. Euclides da Cunha se interessava pelas raízes indígenas do homem do sertão que, para ele, era um "bravo" justamente porque conseguiu domesticar a caatinga, isto é, um meio ambiente bastante inóspito. Sílvio Romero e Nina Rodrigues, por sua vez, postulavam a idéia de que o índio estava em vias de desaparecimento e davam grande importância ao negro que teria se aliado ao branco e prosperado (Ortiz 1985: 18-19). O pensamento de Nina Rodrigues é um bom exemplo, aliás, para demonstrar que a crítica à instituição escravista não implicava necessariamente o argumento da igualdade étnica. Afinal, apesar da viva simpatia que sentia pelo negro, ele pregava sua inferioridade como evidência científica (Ventura 2000: 346)".

Negros e índios eram vistos como entraves ao processo civilizatório. Para resolver tal problema, apostava-se na mestiçagem biológica e moral. Representativo desse ponto de vista é o pensamento de Sílvio Romero, que postulava uma escala ou um ranking de raças, onde o mais inferior era representado pelos índios, seguido dos negros, portugueses, vistos como mestiços de ibéricos e latinos, e, no topo, os arianos, isto é, germanos, eslavos e saxões (Ventura 2000: 343). Para ele, o servilismo do negro, a preguiça dos índios e o caráter tacanho do português produziram uma nação informe, sem qualidades fecundas e originais. Mas sua teoria sobre a mestiçagem previa o branqueamento da população brasileira em um prazo de três ou quatro séculos (Ventura 2000: 344).

Resumindo, para os homens de ciência do fim século XIX, a suposta inferioridade de negros e índios, como dois dos três elementos étnicos formadores da população brasileira, era o maior desafio para a construção de uma nação viável e para a elaboração de uma identidade nacional. Para eles, o tema da mestiçagem era "real" e "simbólico", pois, como explica Renato Ortiz:

concretamente se refere às condições sociais e históricas do amálgama étnico que transcorre no Brasil, simbolicamente conota as aspirações nacionalistas que se ligam à construção de uma nação brasileira. [ ... ] Dentro dessa perspectiva a miscigenação moral, intelectual e racial do povo brasileiro só pode existir enquanto possibilidade. O ideal nacional é na verdade uma utopia a ser realizada no futuro, ou seja, no processo de branqueamento da sociedade brasileira. É na cadeia inferiores", o que politicamente coloca a construção de um Estado nacional como meta e não como realidade presente da evolução social que poderão ser eliminados os estigmas das "raças" (1985: 21).




EUGENIA E TEORIAS RACIAIS NO BRASIL
link: http://www.facol.com/gestus/artigos/artigo5-completo.htm

"Iniciou-se na Europa, a partir da segunda metade do século XIX, uma discussão teórica a respeito da constituição das “raças” humanas. E logo essas teorias chegaram ao Brasil, fato que causou grande confusão entre a elite nacional que teve que “adaptar” os novos pensamentos à realidade racial do Brasil. Para justificar as práticas discriminatórias e racistas, foi criada no século XIX, por Francis Galton, a eugenia, que se caracterizava como um conjunto de idéias e práticas relativas a um “melhoramento da raça humana”. Esses pensamentos chegaram ao Brasil do século XX e tiveram papel determinante no modo de pensar e agir da elite brasileira e, por conseguinte, da pernambucana, pois seus pressupostos explicariam a situação pela qual passava o “atrasado” Brasil e mostrariam como resolver esse problema.
Segundo os pressupostos eugênicos, a hereditariedade determinaria o destino do indivíduo, se seria “inferior” ou “superior”, ou seja, que o pobre era pobre por ser inferior, nascendo predestinado à pobreza. A inferioridade e a superioridade eram dados a priori, determinados pela própria natureza. Por isso os jovens da alta sociedade deveriam exercitar e cuidar de sua saúde e de seu corpo, para que as futuras gerações não nascessem “degeneradas”.
O que a eugenia propunha, em estudos recebidos com alvoroço, era a limpeza da raça, por meio da eliminação de traços humanos indesejáveis. A teoria passou à prática e, nos primeiros anos do século XX, o que se viu no Brasil foi uma espécie de "higiene racial". Procurou-se estabelecer o modo mais eficaz de se “apagar” os cidadãos classificados como sendo de "baixa qualidade racial". Era preciso impedir a "degeneração da raça" e assim como era preciso fazer a higiene das cidades, também se deveria fazer a "limpeza da raça".
No Brasil, o movimento eugenista esteve profundamente articulado à ideologia do “embranquecimento”. No início do século XX, a classe dominante brasileira via-se diante do dilema de um enorme contingente populacional negro politicamente emancipado, porém, socialmente subalterno. Uma das explicações racistas, com pretensões científicas, que sofreu forte influência das idéias européias, foram as obras de Silvio Romero e Nina Rodrigues, pregando a inferioridade genética da raça negra como fator explicativo para tal estado de acontecimentos. Nina Rodrigues foi um dos precursores dos estudos sobre o negro no Brasil, tendo escrito seu livro em finais do XIX e início do XX, embora tenha sido publicado completo somente em 1932. Para ele “a Raça Negra no Brasil, por maiores que tenham sido os seus incontestes serviços à nossa civilização, por mais justificados que sejam as simpatias de que a cercou o revoltante abuso da escravidão, por maiores que se revelem os generosos exageros dos seus turiferários, há de constituir sempre um dos fatores da nossa inferioridade como povo”. Dos fins do século XIX ao primeiro quartel do século XX (especialmente até a entrada dos anos 20), travou-se uma surrealista discussão sobre em quanto tempo o negro deixaria de existir. Os mais “otimistas” acreditavam que em cem anos, os mais “pessimistas” iam até três séculos. Muito mais importante que essa estranha polêmica era o fato que se discutia, sem nenhuma oposição cultural ou política, a ideologia do “branqueamento” com algo definitivo. Segundo os teóricos da época, o negro iria desaparecer da população brasileira através da miscigenação, que depuraria a raça e a levaria ao embranquecimento."
(...)

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Nadia, do seminário Olhar dos viajantes

Nadia, peço-lhe que me envie novo e-mail porque não consegui localizar o anterior. Meu e-mail é adriana.romeiro@uol.com.br
Abraços

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Tarefa para a próxima aula

Pessoal
Para a próxima aula, vocês deverão ler e fichar (resumir) o texto que está no link abaixo:

http://forumpermanente.incubadora.fapesp.br/portal/.rede/numero/rev-NumeroOito/oitovaleria

O título do texto é A IDENTIDADE BRASILEIRA NO SÉCULO 19, por Valéria Piccoli.

É altamente recomendável que leiam Iracema, de José de Alencar.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

O cinema e a luz dos trópicos, segundo Carlos Ebert

Desafio da Luz Tropical
Carlos Ebert, ABC
"Venho pensando há tempos nesta questão, sem contudo me animar a colocar em letra de forma as reflexões a que fui levado, e algumas das conclusões a que cheguei. A existência da página "Textos" no site da ABC me animou a ordenar estas idéias. Espero que possam ter alguma serventia para nós, diretores de fotografia, que temos tanta carência de textos reflexivos sobre a nossa atividade. Recentemente, em entrevista concedida a Lauro Escorel e Tuca Moraes para o site da ABC, nosso decano Mário Carneiro, fez alguns comentários que me serviram de ponto de partida para encaminhar a questão da luz nos trópicos (1). Dizia o Mário naquela ocasião: "Aqui, por exemplo, você sai no sol brasileiro. Você está com 8 diafragmas entre a luz e a sombra! É um inferno. E isso não vai mudar. Nosso clima é esse. Se quiser amansar isso, fazer fotografia tipo Almendros (2), final de tarde. Duas horas de tarde, duas horas de manhã... No meio do dia faz uns planinhos de interior. Acaba ficando uma coisa cansativa, porque parece que só há duas iluminações aqui na terra: Quando o sol nasce e quando o sol se põe. Eu gosto de também ousar. De luzes bem violentas. " A lembrança deste trecho da entrevista me ocorreu ao assistir "Eu, Tu, Eles" 2000, dirigido por Andruscha Waddington e fotografado por Breno Silveira, onde a opção de filmar apenas nas horas de sol baixo foi levada às últimas conseqüências. Apesar de reconhecer os méritos do filme e de apreciar seu tratamento fotográfico, fiquei com a impressão o tempo todo de que o filme não se passava no agreste nordestino, onde uma das características da luz é a sua posição zenital durante as horas do meio do dia. Disso resultam sombras acentuadas e um "esfriamento" das cores resultante da alta temperatura de cor da luz do céu. Ao optar pelo tom dourado e pelas horas próximas ao amanhecer e entardecer, perdeu-se a meu ver, a imagem árida e impactante que caracteriza o sertão nordestino. Eu, Tu, Eles: As sombras longas das horas vespertinas e matutinas. Voltando a entrevista do Mário: "Porque a luz e a cor brasileira têm uma especificidade brasileira. Ela tem um alto-contraste de cor. Porque geralmente a paisagem brasileira tem cor de barro avermelhado e as árvores verdes. Então, é um contraste de cor de duas primárias, vermelha e verde. Isso somado a esse contraste de valor que vai até oito diafragmas. Cria assim momentos em que fica muito difícil você domar um pouco essa imagem. Então você tem que assumir um pouco essa imagem." Se acrescentarmos a terceira primária, o azul do céu, saturadíssimo nos trópicos, teremos então o paroxismo de contraste cromático que é a paisagem brasileira. -o-0-o- Os pintores que retrataram o Brasil já tinham se dado conta deste problema desde o século XVIII. E poucos foram os que assumiram o desafio de reproduzir os contrastes de valor e cromático presentes nas horas do meio do dia. Dentro do meu limitado conhecimento da pintura paisagística brasileira, me ocorre apenas o exemplo de João Batista da Costa (1865-1926) que pintou algumas paisagens cariocas com o sol quase a pino, conseguindo efeitos interessantes. Vista da Igrejinha de Copacabana, J.B. da Costa - 1895 Nesta tela; "Vista da Igrejinha de Copacabana" , Batista da Costa aproveita a luz do meio do dia para ressaltar o contraste cromático entre os verdes da vegetação próxima e distante e os azuis do mar e do céu aos quais atribui valores de luminancia bem próximos, o que resulta num maior contraste cromático. O mesmo local havia sido retratado cinco anos antes por Giambattista Castagneto (1851-1900), outro artista do "Grupo Grimm" (3), que embora considerado um pintor artística e tecnicamente superior à Batista da Costa, refugia-se na suavidade da "hora mágica", evitando o contraste cromático entre Vista da Igrejinha de Copacabana - 1890: a versão suavizada de Castagneto as cores vivas do local o que resulta numa luz "europeizada", suavizada, tão ao gosto do público da época. Antônio Parreiras (1860-1937), em alguns trabalhos também ousou retratar a luz tropical, registrando magistralmente em algumas paisagens o azulado intenso que ocorre nos trópicos quando observamos a sombra do sol a pino. Infelizmente não foi possível encontrar nenhum trabalho do pintor fluminense para ilustrar esta característica. É ainda Mario Carneiro quem observa que o pintor francês Edouard Manet (1832-1883), de passagem pelo Brasil na sua juventude, como grumete na marinha mercante, teria comentado: "Esse é um país muito difícil de ser pintado, eu não consigo pegar essa luz daqui." o-0-o Em nossa cinematografia, antes da cor ser introduzida, o problema da reprodução da luz tropical já existia principalmente com relação ao contraste de luminância. No tempo dos filmes ortocromáticos, o azul do céu resultava num branco lavado e o tom de pele moreno resultava um pouco mais escuro do que era na realidade. Com as emulsões pancromáticas , a adoção dos filtros amarelo, laranja e vermelho para escurecer o azul do céu (influência dos westerns americanos e do cinema mexicano, principalmente dos filmes fotografados por Gabriel Figueroa) e o uso de rebatedores , refletores de arco voltáico e telas difusoras, o contraste de valor foi sendo aos poucos domesticado. Nos filmes da Vera Cruz, fotografados por europeus, este controle sobre a luz tropical atinge a extremos, resultando numa crescente descaracterização da luz brasileira. Situado na fronteira entre o cinema acadêmico e o cinema novo, o episódio "Pedreira de São Diogo" de "Cinco Vezes Favela" 1961, dirigido por Leon Hirzman e fotografado por Ozen Sermet, apresenta uma fotografia acadêmica, com os contrastes de luminancia compensados pelo uso às vezes ostensivo de rebatedores. Como Leon não escondia o seu apreço pelos filmes de Eisenstein, os enquadramentos estetizantes e a luz modelada serviram na medida à narrativa. No mesmo filme, o episódio "Couro de Gato " dirigido por Joaquim Pedro de Andrade e fotografado pelo jovem Mário Carneiro, vai em direção oposta, investindo numa estética documental e numa fotografia de luz existente, onde a continuidade não é o mais importante. Um dos filmes seminais na questão da reprodução da luz tropical na fase do branco e preto, foi "Os Fuzis" 1963, de Rui Guerra, fotografado por Ricardo Aronovich, argentino de nascimento, e na época recém chegado ao Brasil. Em entrevista a ABC, ele comenta: " Essa luz nordestina me fascinou e quebrou todos os meus esquemas conhecidos da Argentina, onde a luz é mais inclinada, (não tanto quanto a européia, que se assemelha a da Patagônia), e mais controlável.... Tenho uma necessidade quase fisiológica de ver, de olhar, de viver pelo menos uma vez ao ano, essa luz que vocês tem a sorte de ter aí. É um pouco como se ela tivesse se fixado na minha retina... E vejo filmes as vezes, fotografados por grandes diretores de fotografia europeus, em lugares que poderiam se parecer com a luz do nordeste, da Bahia, ou do sertão (embora esta seja única), muito bem fotografados, certinhos até, mas que fora a qualidade técnica e mesmo pictórica, não refletem na fotografía, a realidade da luz, da temperatura ou a realidade social da locação em questão". Aqui Aronovich sintetiza o ponto central da questão que estou tentanto enfocar: fazer a cinematografia refletir a realidade da luz local. Outros dois filmes do início do Cinema Novo contribuiram de forma notável para encontrar a luz tropical no branco e preto. São eles; "Vidas Secas" 1963, de Nelson Pereira dos Santos e "Deus e o Diabo da Terra do Sol" 1963, de Glauber Rocha. No primeiro, a dupla de fotógrafos Luís Carlos Barreto e José Rosa conduziu uma experiência de eliminar qualquer filtragem corretiva ("lente nua" no dizer de José Medeiros), e expor para a sombra. deixando as altas luzes "estourarem". O resultado, que lembra muito as xilogravuras que ilustram a literatura de cordel, se mostrou altamente eficaz e integrado à narrativa. Antônio das Mortes em ação: A inevitabilidade da beleza do sertão. Em "Deus e o Diabo na Terra do Sol", Waldemar Lima foi pelo mesmo caminho da super-exposição, embora sua intenção final de ter cópias com alto contraste tenha se frustrado pelo empenho do laboratório (Lider - Rio), em conseguir cópias "corretas". Revendo o filme telecinado, fiquei impressionado com a latitude do antigo Plus-X, pois mesmo expondo para a sombra, se vêem detalhes nas nuvens e no chão de areião. Falando à ABC, Waldemar observou: "Ele (Glauber) queria uma fotografia dura, branca, que retratasse a caatinga e que não fosse um mero acessório pictórico dentro do filme. Não queria uma fotografia bonita. Ele partiu do princípio de que a fotografia não devia ser bonita. E como poderia fazer fotografia não bonita na caatinga, onde qualquer mandacaru bem enquadrado ou contra luz da uma fotografia bonita? Minha proposta foi super-expor o filme, ter um negativo denso e ter uma fotografia branca. Esse foi o princípio do nosso papo... Fiz um teste para o Glauber ver. Filmei durante o dia, sol a pino, uma pessoa com um chapéu largo fazendo sombra escura no rosto e a sombra ficou clara. Vegetação cinza claro. E era isso que a gente queria. O Plus-X tinha 64 ASA, e filmei com 16 ASA. Dois stops de super-exposição." Certamente são poucos os locais no planeta onde se pode fotografar um filme inteiro com um índice de exposição de 12 ISO... Mais adiante Lima esclarece mais sobre outros motivos que o levaram a aquela escolha: " A fotografia estourada além de ter sido uma definição de estilo fotográfico, evitava o uso de rebatedores. Nós não podíamos subir as escadarias do Monte Santo cheios de rebatedores. A solução era aquela mesma; super-exposição." Vidas Secas: Expondo para sombra e deixando os contrastes explodirem L.C. Barreto comentando a fotografia de "Vidas Secas", diz mais ou menos a mesma coisa: " Achávamos que a fotografia devia ser sem luz artificial, sem filtros. Na verdade, uma coisa bem primitiva.... A fotografia de "Vidas Secas" buscava a textura da gravura. Uma fotografia bem contrastada, onde a luz era medida pelo rosto , o tom mais baixo, e o resto ficava com luminosidade estourada, transmitindo a verdadeira luz do Nordeste. Diferente do que se costumava fazer no cinema, com filtros, de maneira que o Nordeste parecia sempre meio nublado, que ia chover, ou como um jardim, sem aquela luminosidade agressiva... "

terça-feira, 12 de maio de 2009

Estética sublime



O termo (do latim sublimis) entra em uso no século XVIII como uma nova categoria estética, distinta do belo e do pitoresco. O termo remete a uma ampla gama de reações estéticas e a uma nova sensibilidade voltada para os aspectos extraordinários e grandiosos da natureza. Para o sublime, a natureza é ambiente hostil e misterioso que desenvolve no indivíduo um sentido de solidão. Em pleno classicismo, a estética do sublime, apoiada na idéia do temor reverencial à natureza, interpela os valores reinantes ligados à ordem, ao equilíbrio e à objetividade. O sublime se dirige ao ilimitado, ao que ultrapassa o homem e todas as medidas ditadas pelos sentidos.
FRIEDRICH, Caspar DavidThe Wanderer above the Mists1817-18Oil on canvas, 94,8 x 74,8 cmKunsthalle, Hamburg

Natureza, entre o pitoresco e o sublime.


Estética do pitoresco (que delícia!)

A visão da natureza apresenta-a como paradisíaca e exuberante, numa pura apreensão estética. Percebe-se aí a valorização da riqueza e singularidade naturais. A natureza suscita, no observador, prazer, gozo, encanto e deleite, constituindo-se como lugar aconchegante que inspira serenidade na alma.




O termo pitoresco entra para o vocabulário artístico no final do século XVIII para designar uma nova categoria estética em relação à paisagem natural e representada, distinto do sublime. Enquanto a poética do sublime apela ao temor reverencial diante da natureza - que se apresenta grandiosa e hostil -, a estética do pitoresco evoca imperfeições e assimetrias em cenas repletas de detalhes curiosos e característicos que procuram remeter a uma natureza acolhedora e generosa. Valoriza-se aí a irregularidade (sempre agradável) da natureza e a interpretação poética de uma atmosfera particular. A expressão artística exemplar do pitoresco é a paisagem dos jardins ingleses. Aliás, o pitoresco, segundo Giulio Carlo Argan, "expressa-se na jardinagem", arte de educar a natureza, melhorando-a, mas sem tirar-lhe a espontaneidade. Tanto o sublime quanto o pitoresco estão na raiz do romantismo. O sublime apontando para o trágico, o infinito e o universal; o pitoresco enfatizando o característico, o mutável e o relativo.

As paisagens pitorescas empregam, em geral, tonalidades quentes e luminosas, que destacam a irregularidade e a diversidade das coisas do mundo natural. Os cenários são compostos a partir de amplo repertório: árvores, troncos caídos, poças de água, choupanas, animais no pasto, pequenas figuras etc.


Imagem: CONSTABLE, JohnDedham Lock and Millc. 1818Oil on canvas, 70 x 91 cmPrivate collection

O olhar sobre a natureza no século XIX

Dá-se valor total à presença e ao olhar sobre os seres, em busca de uma percepção empírica. A nomenclatura deve nomear as semelhanças e diferenças visíveis entre os seres. Neste sentido, o quadro classificatório recorta a natureza e a reconstrói num sistema de ordem onde prevalece o princípio cumulativo, isto é, novas espécies podem ser descobertas. O resultado é uma taxionomia, entendida como quadro de ordenação das espécies naturais. Diante de um espécime natural, o artista o desenha, cuidando de representar a figura, o número, a proporção e a situação.

A revolução de Lineu

Lineu (1707 a 1778), sueco, autor da Systema Naturae, de 1758, opera uma transformação radical do conhecimento da naturez, rompendo com a visão antropocêntrica, que pensa a natureza em função de sua utilidade alimentar e medicinal. Seu olhar não busca analogia, mas sim as características estruturais intrínsecas aos seres da natureza, para fundamentar a igualdade e a diferença entre as espécies. O método de Lineu pode ser assim resumido: olho vê o objeto, o objeto é catalogado e classificado. A adoção de nomes latinos visa romper com a visão subjetiva de crenças e preconceitos. É o olhar que torna os seres inteligíveis e permite a sua classificação. Para Lineu, a natureza é imutável, com a repetição das espécies, na qual um ser cria outro semelhante. Trata-se de buscar a universalidade típica das espécies e gêneros (reprodução da vida semelhante). Do método de Lineu, decorre uma arte, cujas características são a
- clareza do desenho
- mostra as diferenças de cada espécie
- segundo Lineu, a individualização de cada planta depende da figura, número, proporção e situação.
- Planta: raiz, caule, folhas, flores e fruto, que são apreendidos na figura, número, proporção e situação.
- Desenho deve apreender a forma geométrica e as proporções matemáticas, que permitem a individualização de cada espécie.
- Nomenclatura: identifica semelhanças e diferenças.

Alexander von Humboldt e a natureza

Seu trabalho traz uma nova concepção científica da natureza, marcada pela valorização da observação. A paisagem é abarcada de forma totalizante e interativa: implica o artista cientista, que coloca a sensibilidade e a razão para apreender a natureza. Com esta nova abordagem, tem-se a promoção da observação do conjunto e não dos vegetais isolados. Tal princípio decorre de uma perspectiva clássica, na qual o universo é concebido como cosmos ordenado e contínuo, no qual é preciso situar os seres. Por esta razão, o desenho é um meio de conhecimento da natureza, que se vale da observação sensível, permitindo assim a organização do conhecimento científico. Na arte, o mundo visto é organizado em uma segunda natureza: seres recortados e figurados nos cadernos de anotação de campo dos viajantes, os espécimes coletados, retirados de um continuum natural e dispostos em herbários e mostruários. Cria-se uma nova ordem.

Algumas expedições científicas do século XIX

Principais Expedições
1.) Missão Austríaca, entre 1817 e 1821, liderada pelo princípe von Wied-Neuwied.
2.) Spix e Martius: 1817 a 1820
3.) Expedição do Barão Langsdorf: 1822 a 1829

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Arte Brasileira no século XIX

Com base no livro de Sonia Gomes Pereira, podemos levantar algumas questões importantes, que irão nortear a nossa análise da produção artistica no Brasil novecentista.
1.) A mudança decisiva no cenário das artes plásticas com a vinda da família real em 1808, traduzida no propósito de modernizar o país. A criação da Academia Imperial de Belas Artes faz parte deste processo: a tentativa de atualizar o gosto artístico local, com a implantação da estética acadêmica vigente na França, abriu caminho para a formação de artistas e o incremento das conexões culturais entre Brasil e Europa. O que surge aqui no século XIX é um gosto mais afinado com as novas modas artísticas, sobretudo o neoclassicismo. Coube à Academia garantir os "fundamentos culturais da nação e a inserção do país no panorama cultural internacional" (Sonia Gomes Pereira, p. 109).
2.) Academicismo não significa neoclassicismo: nem sempre o neoclássico reinou absoluto. É preciso lembrar a influência das estéticas românticas e realistas na produção artística local, matizando a idéia da dominancia absoluta do neoclássico. O resultado disso é que os estilos não s sucedem, de forma linear, ao longo do tempo, permitindo, ao contrário, a sobreposição de múltiplos estilos num mesmo momento e por vezes até numa mesma obra.
3.) A produção artística brasileira no século XIX não pode ser considerada uma mera cópia dos modelos franceses, alienada da realidade brasileira. Esta visão, que predominou até recentemente, foi responsável por um certo desprezo preconceituoso em relação à arte brasileira do século XIX. Estudos recentes buscam desmontar tal interpretação, insistindo nos processos complexos que subjaziam à importação dos modismos europeus.
4.) Diversidade dos suportes da arte brasileira: a arte não se limitou, evidentemente, à pintura. É preciso lembrar a arquitetura, revitalizada pela Missão Artística Francesa, a escultura, a literatura e, em meados do século XIX, a fotografia.
5.) Diversidade temática: a arte brasileira do século XIX descobre o Brasil, a começar pela paisagem, pelas gentes, pela histórica e pelos temas ligados à realidade nacional, desembocando numa arte nacional.